quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Mr. Olbermann

Há algum tempo, postei sobre o andamento da proposta 8, que propunha a extinção do direito do casamento entre homossexuais. Bom. Ela foi votada e, enquanto a vitória do Obama me deixou mais esperançosa, infelizmente a proposta passou.

Hoje estive fuçando no blog da vocalista da banda OTEP, Otep Shamaya, onde ela agradecia a um tal de Keith Olbermann. Ela é lésbica e ativista (e uma baita vocalista). Fiquei curiosa e fui procurar o que este Olbermann havia feito. Achei.

O discurso de Keith Olbermann (jornalista que já trabalhou na CNN e FOX) sobre a passagem da Proposta 8 nos EUA, feito ao vivo em seu programa de notícias, é algo que traduz tudo que eu já havia tentado escrever e pensar sobre o assunto. Achei válido traduzi-lo e coloca-lo aqui... É algo que tem que ser dito... E entristece saber que o que ele fala é tão verdadeiro, e mesmo assim algumas pessoas simplesmente ignoram.

"Primeiramente, hoje como prometido, tenho um comentário especial sobre a passagem, na semana passada, da Proposta 8 na Califórnia, que retirou o direito do casamento entre pessoas do mesmo sexo, e balançou todo o país para pensar sobre o assunto.

Alguns parâmetros, como prefácio: Isso não é sobre disputas, não é sobre política, e isso não é exatamente só sobre a Prop-8. E eu não tenho nenhum interesse pessoal nisto: não sou gay, tive que me esforçar pra pensar em um membro distante de minha família que seja, e não conheço histórias de amigos ou colegas próximos que estejam lutando contra o preconceito.

E ainda assim, pra mim esta votação é horrível. Horrível. Porque isso não é sobre disputas, e não é sobre política.

Isso tudo é sobre... o coração humano, e se isso soa bobo, que seja.
Se você votou por esta Proposta ou apóia quem votou ou o sentimento que ela expressou, eu tenho algumas perguntas, pois, sinceramente, eu não... entendo. Por que isso importa a vocês? O que isso é pra vocês?

Em tempos de impermanência e relacionamentos relâmpago, estas pessoas aqui querem a mesma chance de permanência e felicidade que é opção pra vocês. Eles não querem negar-lhes a sua chance. Eles nã querem tirar nada de vocês. Eles querem o que vocês querem: a chance se serem um pouco menos sozinhos no mundo.

Só que agora vocês estão dizendo a eles: não. Vocês não podem ter isto dessa maneira. Talvez algo parecido. Se eles se comportarem. Se eles não causarem muitos problemas. Vocês até darão a eles os mesmos direitos legais, mesmo enquanto vocês estão tirando deles o direito legal que eles já tinham. Um mundo ao redor deles ainda baseado em amor e casamento, e vocês estão dizendo: não, vocês não podem se casar. E se alguém passasse uma lei dizendo que você não pode se casar?

Continuo ouvindo este termo: "redefinir" o casamento.

Se este país não tivesse redefinido o casamento, negros ainda não poderiam casar-se com brancos. 16 estados tinham leis que tornavam isto ilegal... em 1967. 1967.

Os pais do presidente eleito dos EUA não poderiam ter casado em cerca de um terço dos estados do país onde cresceram para liderar. Mas é pior que isso. Se este país não tivesse "redefinido" o casamento, alguns negros não poderiam se casar... negros. Essa é uma das partes mais cruéis e ignoradas de nossa triste história de escravidão. Casamentos não eram reconhecidos legalmente se as pessoas eram escravas. Como escravos eram propriedade, eles não podiam legalmente ser marido-e-esposa, ou mãe e filho. Os votos de seus casamentos eram diferentes: não "Até que a morte nos separe", mas "Até que a morte ou a distância nos separe". Casamentos entre escravos não eram legalmente reconhecidos.

Sabe, exatamente como casamentos hoje na California não são legalmente reconhecidos, se as pessoas são... gays.

E incontáveis em nossa história são os homens e mulheres, forçados pela sociedade a casarem-se com o sexo oposto, em casamentos arranjados ou de conveniência, ou somente casamentos de ignorância - séculos de homens e mulheres que viveram suas vidas com vergonha e infelicidade e que tiveram, através de uma mentira para si mesmos, quebrado incontáveis outras vidas, de esposas e filhos... Tudo porque nós dissemos que um homem não poderia casar-se com outro homem, ou que uma mulher não poderia casar-se com outra mulher. A santidade do casamento. Quantos casamentos como estes houveram e COMO eles aumentam a "santidade" do casamento, ao invés de simplesmente fazer o termo... perder seu significado?

O que é isso pra você? Ninguém está pedindo que você abrace a expressão de amor deles. Mas vocês não devem, como seres humanos, abraçar... o amor? O mundo já é difícil o suficiente.

Está moldado contra o amor, contra a esperança e contra aquelas poucas e preciosas emoções que permitem que nós consigamos ir adiante. O seu casamento tem somente uma chance de 50-50% de durar, não importa o quanto você sinta e quão duro você trabalhe.

E há pessoas tão felizes pelo prospecto apenas dessa chance e este esforço, só pela esperança de poder ter esse sentimento. Com tanto ódio no mundo, tanta divisão sem sentido, e pessoas agindo contra pessoas sem boas razões, isso é o que a sua religião lhe diz pra fazer? Com a sua experiência de vida e deste mundo e de toda a sua tristeza, isso é o que a sua consciência lhe diz pra fazer?
Com seu conhecimento de que a vida, com infinito vigor, parece pender o campo onde todos vivemos em favor de infelicidade e ódio... Isso é o que o seu coração lhe diz pra fazer? Você quer santificar o casamento? Quer honrar o seu deus e o amor universal que você crê que ele representa? Então espalhe felicidade - este pequeno, simbólico, semântico grão de felicidade - divida-o com todos que o procuram. Cite pra mim qualquer coisa de seu líder religioso ou seu livro escolhido que diga-lhe para ficar contra isso. E então diga-me como você pode acreditar nessa declaração e em outra, outra que diz somente "trate os outros como você gostaria que os outros lhe tratassem".

Você é questionado agora, pelo seu país, e talvez pelo seu criador, para ficar de um dos lados. Você é questionado a se posicionar, não numa questão política, não numa questão religiosa, não numa questão de hétero ou gay. Você é questionado a se posicionar numa questão de... amor. Tudo o que você tem que fazer é posicionar-se, e deixar a pequena cinza do amor encontrar seu próprio destino. Você não tem que ajudá-la, não tem que aplaudí-la, você não tem que lutar por ela. Somente não a apague. Só não a extingua. Porque, por mais que à primeira vista este amor entre duas pessoas que você não conhece e que você não entende e que, talvez, você nem queira saber sobre... é, na verdade, a cinza do seu amor, pelo seu companheiro/a.

Só porque este é o único mundo que temos. E porque a outra pessoa também conta.

Essa é a segunda vez em 10 dias que eu concluo me referindo, dentre todas as coisas, ao pedido final de misericórdia de Clarence Darrow, num julgamento de homicídio.

Mas o que ele disse se encaixa no que está realmente no âmago disso tudo:

"Eu estava lendo noite passade, sobre a aspiração do antigo poeta persa Omar-Khayyam" ele disse ao juíz. "Pareceu-me a coisa mais elevada que posso imaginar. Gostaria que estivesse em meu coração, e no coração de todos:

Deixe-me ser escrito no Livro do Amor;
Não me importo sobre o livro acima.
Apague meu nome ou escreva-o como quiser,
Porque serei escrito no Livro do Amor."

Boa noite, e boa sorte."

Assim como a Otep, eu também agradeço, Keith.

Um comentário:

Anônimo disse...

Só uma coisinha a dizer: esse mundo é podre, vai acabar sucumbindo na própria podridão e, talvez depois disso, as coisas comecem a ser melhor obedecidas.

Beijos (: